O contra campo em "olhos azuis, cabelos pretos"
"Ele diz que em todo o caso quer tocar seu corpo com as mãos, talvez sem olhar, porque o olhar nada tem a fazer ali."
Marguerite Duras
“Olhos azuis Cabelos pretos” expõe a delicada relação de duas pessoas que não se conhecem. Tão pouco possuem, como eles mesmo colocam, uma história em comum, a não ser pelo jovem estrangeiro que cruza seus caminhos. Eles estabelecem um acordo: Ela viria passar as noites com ele, que em troca, lhe daria dinheiro. “Por que o dinheiro? Ele responde: Para pagar. Para dispor do seu tempo como decidi. Para mandá-la embora quando quiser. E, de antemão, saber que obedecerá. Para ouvir minhas histórias, as inventadas e as verdadeiras.” (DURAS, Marguerite. p. 28-29)
O romance se passa em uma cidade balneária, turística. Pressupõe a presença de pessoas passageiras. Nada é permanente. Nos rochedos, perto do mar, sem nomes vagam em busca de carícias e encontros. Os protagonistas de Marguerite Duras também caminhariam pela vasta região abandonada, caso não tivessem se encontrado em uma noite qualquer, em um café qualquer.
No recorte do espaço e do tempo que propõe, o livro deliberadamente concentra sua atenção no que a narrativa clássica costuma deixar fora do campo imaginário para não perder de vista o que quer dizer. É o recurso do não dito que desvela os personagens no âmago de seus temores de intimidade. Quando se referem ao fim, normalmente citam a morte, porque trata-se da total aniquilação daquilo que existiu. Deixar-se afetar é deixar-se perder, morrer.
Nas páginas que seguem, o leitor testemunha o esforço dos heróis de permanecerem superficiais. A venda de seda negra, o canto escuro do quarto, refúgios do olhar objetivo que não somente remetem ao reprimido, mas o revelam como ele essencialmente é. Music Hall de Jean-Luc Lagarce encontra Duras justamente na recusa em tramar uma história bem delineada, em buscar trazer o leitor para dentro