O barril de amontillado

2134 palavras 9 páginas
EDGAR ALLAN POE FICÇÃO COMPLETA – CONTOS DE TERROR, MISTÉRIO E MORTE

O BARRIL DE AMONTILLADO

Suportara eu, enquanto possível, as mil ofensas de Fortunato. Mas quando se aventurou

ele a insultar-me, jurei vingar-me. Vós, que tão bem conheceis a natureza de minha

alma, não havereis de supor, porém, que proferi alguma ameaça. Afinal, deveria vingar- me. Isso era um ponto definitivamente assentado, mas essa resolução, definitiva, excluía

idéia de risco. Eu devia não só punir, mas punir com impunidade. Não se desagrava uma

injúria quando o castigo cai sobre o desagravante. O mesmo acontece quando o vingador

deixa de fazer sentir sua qualidade de vingador a quem o injuriou.

Fica logo entendido que nem por palavras nem por fatos dera causa a Fortunato de

duvidar de minha boa-vontade. Continuei, como de costume, a fazer-lhe cara alegre, e ele

não percebia que meu sorriso agora se originava da idéia de sua imolação.

O Fortunato tinha o seu lado fraco, embora a outros respeitos fosse um homem acatado e

até temido. Orgulhava-se de ser conhecedor de vinhos. Poucos italianos têm o verdadeiro

espírito do "conhecedor". Na maior parte, seu entusiasmo adapta-se às circunstâncias do

momento e da oportunidade, para ludibriar milionários ingleses e austríacos. Em matéria

de pintura e ourivesaria era Fortunato, a igual de seus patrícios, um impostor; mas em

assuntos de vinhos velhos era sincero. A este respeito éramos da mesma força.

Considerava-me muito entendido em vinhos italianos e sempre que podia, comprava-os

em larga escala.

Foi ao escurecer duma tarde, durante o supremo delírio carnavalesco, que encontrei meu

amigo. Abordou-me com excessivo ardor, pois já estava bastante bebido. Estava

fantasiado com um traje apertado e listado, trazendo na cabeça uma carapuça cônica

cheia de guizos. Tão contente fiquei ao vê-lo que quase não largava de apertar-lhe a mão.

E disse-lhe:

- Meu caro

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