o amor transforma
Categoria: Meditações -
Só o amor tem poder de transformar
Ricardo Gondim
Victor Hugo tem uma genialidade assombrosa. Em Os miseráveis, Jean Valjean, um egresso das galés, talvez conste como uma das personagens mais bem construídas da literatura.
Livre da cadeia há quatro dias, Jean Valjean não encontra quem o acolha. O passado o persegue. Ele é um proscrito. Cansado, tremendo de frio e faminto, precisa de um lugar para descansar. Sabendo que o prenúncio de uma nova chuva o matará, Valjean tenta achar um albergue. Em vão. Ninguém o quer. Os cachorros o enxotam. Desesperado, se depara com uma mulher que indica a casa do bispo D. Bienvenu como única possibilidade de acolhimento. A anônima diz que o homem de Deus seria capaz de hospedar-lhe.
Ao bater na porta da casa do bispo, Jean Valjean não esconde a vida pregressa. Mesmo assim, D. Bienvenu o recebe, convida para dividir a ceia e ainda oferece bons lençóis para a noite de sono. O ex-presidiário, entretanto, ainda padece os efeitos de sua história. Ele tem um estigma; é um sentenciado embora não tenha cometido o crime banal que o levou à cadeia. Valjean age como um animal encurralado e agredido, que procura se defender.
Resolve então fugir da casa do bispo. Nas caladas da madrugada, antes de sair, rouba os talheres de prata. Contudo, não vai muito longe. Os guardas o pegam, reconhecem as insígnias do bispo na prataria e o conduzem de volta à casa que o acolheu. A sina é retornar ao cárcere.
Surpreendentemente, D. Bienvenu não só perdoa como o salva. Diante da prata roubada, o desconcerta com uma pergunta e uma oferta: Estimo tornar a vê-lo. Mas eu não lhe dei também os castiçais? São de prata como os talheres e poderão render-lhe bem duzentos francos. Por que não os levou também?
Diante do gesto nobre de não levar em conta o roubo e ainda oferecer castiçais, Jean Valjean arregalou os olhos e contemplou o venerando Bispo com tal expressão que nenhuma língua humana