O abandono da razão
A INFÂNCIA E A FAMÍLIA*
Claudia Fonseca, UFRGS
O tema dessa mesa foi colocado como “A infância no Brasil: razões do abandono”, dentro de um seminário que se propõe como tema de reflexão: Psicanálise e colonização: leituras do sintoma social no Brasil.
Querendo situar meu olhar, antropologico, em relação a outros, propus um título provocador: “O abandono da razão: a descolonização dos discursos sobre a infância e a família”. Pois, parece-me que se quisermos avançar nas nossas discussões, é imprescindível criar instrumentos
“reflexivos”de análise, isto é, que permitam examinar os valores da classe dos pesquisadores que têm norteado os termos usuais de análise. Para ser mais precisa, sugiro que se seguirmos na proposta louvável do seminário, seremos obrigados a questionar a obsessão com a criança vitimizada - imagem que vem galopando através das páginas dos nossos jornais com cada novo nenê achado “no lixo”, e que aparece de forma insistente nas discussões sobre políticas públicas que lidam com família pobres. Recentemente, pesquisadores do campo sociológico têm devotado muita atenção à maneira como um ou outro tipo de comportamento acaba sendo eleito, pela opinião pública, como “problema social”1. Tentam entender os processos que definem os temas de destaque - as “causas” que, em determinada conjuntura comovem o público, angariam fundos, e mobilizam frentes de ação. Por que, por exemplo, existem 500
ONG’s apenas no Rio de Janeiro, voltadas para a infância pobre quando outras causas
(tais como saneamento básico, a condição das cadeias, ou mesmo o reciclamento do lixo) parecem incapazes de motivar mais de meia dúzia de associações2. Essa linha de investigação não nega a importância dos temas destacados; apenas sugere que não existe uma relação direta entre a gravidade do problema e o tamanho das atenções
(volume e intensidade emocional) voltadas para ele. O que consta - na opinião