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http://memorial.org.br/revistaNossaAmerica/23/port/55-debate.htm
español português Fernando Henrique Cardoso
Não existe uma, mas várias Américas Latinas. Na verdade, o próprio nome “América Latina” é uma ficção. Cunhado no século XIX, quando a França se encontrava interessada em conquistar domínio direto ou indireto na região, visou desde logo borrar a origem ibérica dos países que então surgiam na esteira dos movimentos de independência vitoriosos, um após outro, nas ex-colônias de Espanha e Portugal no continente americano. Longe de resultar em unidade, os movimentos de independência produziram realidades políticas distintas. Não apenas entre as ex-colônias espanholas, que se fragmentaram em muitas repúblicas, de um lado, e a ex-colônia portuguesa, o Brasil, de outro, senão que também entre as primeiras, onde diferenças nas formações sociais já eram perceptíveis no período colonial e se acentuaram depois da independência. Dizer que não há uma, mas várias Américas
Latinas não significa afirmar que inexista uma certa comunidade de heranças, problemas e desafios entre os países que compõem esse espaço geográfico. Tanto existe que mesmo irrealizável, por descabida, a idéia da “unidade latino-americana”, a despeito de tudo, persiste viva há quase dois séculos. A questão é entender sobre que bases, valores e aspirações atuais ela pode ter vigência e desenvolver-se, na pluralidade das suas diferenças.
Em nossa formação histórica mais remota, há pelo menos três elementos compartilhados, ainda que com
“variações nacionais” significativas. Primeiro, a conquista ibérica e o transplante e adaptação para o novo mundo das instituições correspondentes, no campo da política, do direito e da religião (a igreja católica, o direito romano, o patrimonialismo, etc). Segundo, a larga duração de regimes de trabalho coercitivo impostos a amplos contingentes de nativos, bem como de cativos da África, pedra angular de sistemas de produção baseados na