A universidade e a liberdade humana
Muito da ansiedade e sentimento de perigo de nossa época decorre de não querermos ver os problemas e crises do presente dentro da perspectiva histórica, como etapas de um desenvolvimento contínuo da espécie, na sua lenta adaptação ao novo tipo de tradição, que a formulação racional do pensamento vem, há dois mil e quatrocentos anos, procurando implantar e que, a despeito dos rápidos períodos de afirmação, está longe ainda de ser a generalizada e universal tradição da humanidade. Esta tradição é a tradição da liberdade e da razão, de que a Grécia se fez, por um extraordinário concerto de circunstâncias, um paradigma legendário. (p.125) Com efeito, se de muito parece estar encerrada a evolução biológica do homem, a sua evolução como animal racional está apenas iniciada. (p.125) Somente por volta de quinhentos a quatrocentos anos antes da era cristã é que duas tentativas intelectuais marcam o aparecimento da possibilidade racional de organização da vida humana – a de Confúcio, na China, e a de Péricles, na Grécia. (p.126) Mas, o novo progresso, de que tanto a experiência de Confúcio quanto a de Péricles nos dão testemunho, a adaptação do homem á razão, não era um progresso biológico da espécie, e sim um progresso a ser aprendido pelos indivíduos, um a um, e quase lentamente poderia ser traduzido em novas instituições, suscetíveis de concretizá-lo em uma organização social. (p.126) Na realidade, este progresso decorria do aparecimento de uma nova arte, da grande arte descoberta para a tradição ocidental pelos gregos, a arte de pensar, de reformular os objetos humanos, de criticar-lhes as premissas, de especular sobre os pressupostos em que estas se apoiavam e deduzir as conclusões, arte que se destinava a criar um novo homem e a fazer das civilizações, não o resultado do jogo mais ou menos cego de acidentes históricos, mas a conseqüência do exercício lúcido dos seus recursos mentais, na melhor utilização do