A significação do golpe de abril
Artigo de Caio Navarro de Toledo *
Num depoimento, em 1981, o ex-ditador Ernesto Geisel declarou: "o que houve em 1964 não foi uma revolução. As revoluções se fazem por uma idéia, em favor de uma doutrina". Para o vitorioso de abril, o movimento se fez contra Goulart, contra a corrupção, contra a subversão. Estritamente falando, afirmou o general, o movimento liderado pelas Forças Armadas não era a favor da construção de algo novo no país.
Embora lúcidas - na medida em que rejeitam a noção de Revolução -, as formulações do ex-ditador podem ser objeto de uma contraleitura. Assim, com legitimidade teórica, podemos ressignificar todos os contras presentes no depoimento do militar. Mais apropriado seria então afirmar que 1964 representou um golpe contra a incipiente democracia política brasileira; um movimento contra as reformas sociais e políticas; uma ação repressiva contra a politização das organizações dos trabalhadores e do rico debate ideológico e cultural que estava em curso no país.
Em síntese, no pré-64, as classes dominantes e seus aparelhos repressivos e ideológicos - diante das legítimas iniciativas e reivindicações dos trabalhadores (no campo e na cidade) e de setores das classes médias -, apenas vislumbravam "crise de autoridade", "subversão da lei e da ordem", "quebra da disciplina e da hierarquia" e "comunização" do país. Por vezes, expressas de forma altissonante e retórica, tais demandas, em sua substância, reivindicavam o alargamento da democracia política e a realização de reformas do capitalismo brasileiro.
Em toda nossa história republicana, o golpe contra as frágeis instituições políticas do país se constituiu em ameaça permanente. O fantasma do golpe rondou, em especial, os governos democráticos no pós-46 e, com maior intensidade, a partir dos anos 60. Pode ser dito que o governo Goulart nasceu, conviveu e morreu sob o espectro do golpe de Estado. Em abril de 1964, o golpe - permanentemente reivindicado