a rota dos escravos
Flávio Rabelo Versiani2
1. Introdução
Este ensaio discute algumas questões relacionadas à escravidão no Brasil, objeto de debate na literatura, e que podem, como se verá, ser melhor compreendidas à luz de proposições simples da teoria econômica.
O estudo do sistema escravista brasileiro expandiu-se vigorosamente no período recente3 ; contudo, não se tem dado muita ênfase aos aspectos econômicos dessa instituição. Não que esses aspectos tenham sido inteiramente negligenciados; ao contrário, existem trabalhos de importância sobre a questão da lucratividade do uso da mão-de-obra escrava, por exemplo, assim como estudos baseados numa visão econômica da escravidão na linha das análises clássicas de Weber e Marx4. No entanto, alguns pontos relevantes da moderna análise econômica do escravismo não têm sido suficientemente explorados, no caso do Brasil. Este ensaio pretende chamar atenção para esses pontos.
O artigo está organizado como se segue. Os conceitos básicos são apresentados na seção II. Esses conceitos são usados para discutir alguns pontos da literatura sobre a escravidão no Brasil (seção III), e para analisar aspectos da escravidão nos engenhos de açúcar dos estados nordestinos (seção IV), nas plantações de café do sudeste (seção V), e em outras atividades produtivas (seção VI). Uma seção final reúne as conclusões da argumentação. 2. Trabalho escravo: alguns conceitos básicos
1
Tradução de “Brazilian Slavery: toward an Economic Analysis”, Revista Brasileira de Economia
48(4):463-478, dez. 1994. Traduzido por Fábio Souza de Oliveira, com revisão do autor.
2
Departamento de Economia, Universidade de Brasília.
3
Não existe uma resenha dessa literatura mais recente; algumas referências podem ser encontradas em
Klein (1987) e Gorender (1990).
4
Sobre a lucratividade dos escravos do ponto de vista microeconômico, ver, por exemplo, Portocarrero
(1973), Slenes (1976), Mello