A querela dos universais
Durante a Idade Média, a natureza dos universais deu lugar a intensos debates entre as mentes mais brilhantes desse período. Debate que ficou conhecido como querela dos universais.
A querela tem início com uma série de questões colocadas por Porfírio (232-304) no prefácio de sua Introdução às Categorias de Aristóteles (Isagoge). Recusando-se a tomar partido em favor de Aristóteles ou Platão, Porfírio limita-se a anunciar qual é a natureza do problema.
Quando se refere às ideias gerais (como o gênero animal e a espécie homem), identifica-se determinadas características comuns que permitem dizer que Maria, João e José pertencem à espécie humana - e que humanos, aves e peixes são animais.
Muito bem, a questão é se tais gêneros e espécies são realidades subsistentes em si ou simples concepções do nosso espírito. Ou seja, quando formo o conceito de "gato", ele é apenas uma abstração ou existe algo como uma "gatuidade" presente em cada um dos indivíduos e que me permite reconhecê-los como tais? Supondo-se que o universal tenha algum suporte na realidade, tal suporte é corpóreo ou incorpóreo? Mais ainda: supondo que sejam incorpóreos, eles existem à parte das coisas sensíveis ou somente unidos a elas?
Boécio (470-525), que traduziu a Isagoge do grego para o latim, logo percebeu o magnífico programa que as questões de Porfírio anunciavam. Além disso, viu nelas uma oportunidade de apresentar uma solução capaz de conciliar Platão e Aristóteles em uma única teoria.
Inicialmente, o filósofo latino concorda com Aristóteles sobre a impossibilidade de ideias gerais serem substâncias, já que os gêneros e as espécies são comuns por definição, e o que é comum a vários indivíduos não pode ser um indivíduo. Por outro lado, imaginemos que as ideias gerais são simples representações de nosso espírito, isto é, que nenhum objeto corresponda na realidade às ideias que temos deles. Mas um pensamento sem objeto não é sequer um pensamento. Logo, é