A PRAGMÁTICA E O DISCURSO FICCIONAL
Simone de Campos Reis2
Uma vez que a pragmática é a teoria de todos os usos da linguagem não há razão para restringi-la à análise do uso da linguagem ordinária, deixando a literatura, espaço privilegiado para a emergência do sujeito e daquilo que o constitui porque se faz da palavra, de fora de sua abordagem. Incorporar o discurso ficcional aos estudos da pragmática pode significar um aprofundamento e enriquecimento de ambas as disciplinas, embora essas incursões de estudos literários à pragmática façam com que os estudiosos da linguagem preocupem-se, como diz Dascal (2006), com idéia de terem que abandonar alguns dos seus dogmas arraigados e promoverem alguma reforma em seus pressupostos teóricos. Dificuldades e problemas podem surgir de tal interação; mas, pode haver esperança de “aventuras interdisciplinares” que tragam benefícios e cooperação entre essas disciplinas. À luz dos pressupostos teóricos de Searle (1995), a respeito do estatuto lógico do discurso ficcional, este trabalha tenta apontar uma possibilidade de interação entre pragmática e discurso ficcional.
Quando falamos ou escrevemos em uma língua estamos realizando atos de fala, chamados de “atos ilocucionários”. Fazemos enunciados, perguntamos, damos ordens, prometemos, desculpamo-nos, agradecemos, e outros. Existe um conjunto sistemático de relações entre os significados das palavras e sentenças que emitimos e os atos ilocucionários que realizamos quando emitimos essas palavras e sentenças. Nesta concepção, Searle (1995, p. 95-96) diz que a existência do discurso ficcional é um problema sério, de solução difícil e pergunta:
“Como é possível que as palavras e outros elementos tenham, numa história, seus significados ordinários e, ao mesmo tempo, as regras associadas a essas palavras e outros elementos, regras que determinam seus significados, não sejam cumpridas?”
Como podemos considerar que, na história “O Gato de Botas”, “Botas” significa botas e ao mesmo