A Pasta a mosca e os Sapatos
Adalberto José
Aline Moraes
Edygleyson Farias
Gislene Alves
Lug Pompeu
Marcelo
Maydson Brasil
Nicholas Bianchi
Samuel Sampaio
Moreira Campos 1914 - 1994
TEMÁTICAS DO CONTO
Doença Terminal ( câncer)
Estrutura familiar
Dedicação Profissional
A mosca, a pasta e os sapatos.
Quando ele sentiu que ia morrer, que tudo chegava ao fim (o médico do
Instituto, depois de abri-lo, dera-lhe seis meses de vida), chamou o filho mais velho e, naquela manhã de domingo, conversam muito na saleta. Deu instruções ao filho, mostrando-lhe a carteira de trabalho. Deixava também um pequeno seguro. O moço, a pedido dele, colheu a apólice na gaveta da mesinha. - Fale mais não. O senhor está cansado.
Fechava os grandes olhos amarelos, que a doença dilatara. Tomava alento:
- Ainda bem que esta casa é nossa.
- Claro.
- Trabalhei para isso. Economizei. Fiz disso um costume.
-Sei. Sei.
A mosca, a pasta e os sapatos.
O filho valia-se mais da repetição: - Sei, sei. Silêncio. Tangeu a mosca que pousava no canto da boca do doente. A galinha cacarejou no pequeno quintal, a réstia de sol insistia na soleira.
- Sua mãe foi uma grande companheira.
- Sei. Sei disso.
- Me ajudou muito.
Pedia que ele e os irmãos a amparassem. Os filhos eram seis, cinco homens e uma mulher. Esta também casada e morando em Salvador.
Deveria chegar no dia seguinte pela Rodoviária. Todos, mais ou menos orientados. Miguel, o mais velho, que ali estava, mecânico, bom mecânico.
Mesmos os dois mais novos, já trocadores de ônibus, emprego que ele próprio arranjara, quando ainda tinha saúde, embora desconfiasse que algo o começava a minar: a inapetência, o tique de apalpar o endurecimento no intestino, bola de carne que prendia entre os dedos graúdos. A mulher ralhava: - tira esta mão daí, homem! Recompunha-se, preocupado. A mosca, a pasta e os sapatos.
Na saleta teimava o silêncio. O filho, mais uma vez, relanceou os olhos em volta.
Tornou a tanger a mosca. Deteve-se