A Função do Dogma Científico
Thomas Kuhn
Retirado de: KUHN, T. A função do dogma na investigação científica; organizador: Eduardo Salles O. Barra; tradução: Jorge Dias de Deus. Curitiba : UFPR. SCHLA, 2012.α
1.
Estou certo de que cada um dos participantes deste simpósio se expôs, a dada altura de sua carreira, à ideia do cientista como o investigador sem preconceitos em busca da verdade; o explorador da natureza – o homem que rejeita preconceitos quando entra no laboratório, que coleciona e examina os fatos crus, objetivos, e que é fiel a tais fatos e só a eles. Estas são as características que fazem do testemunho dos cientistas um valioso elemento na propaganda de produtos variados e em exclusivo nos Estados Unidos.
Mesmo perante uma audiência internacional não é preciso esclarecer mais. Ser científico é, entre outras coisas, ser objetivo e ter espírito aberto.
2.
Provavelmente nenhum de nós acredita que o cientista da vida real na prática consegue preencher tal ideal. A experiência pessoal, os romances de Sir
Charles Snow ou o estudo da história da ciência fornecem numerosas contra-evidências. Embora a atividade científica possa ter um espírito aberto – qualquer que seja o sentido que esta frase possa ter – o cientista individual muito frequentemente não o tem.
Quer o seu trabalho seja predominantemente teórico, quer seja experimental, o cientista normalmente parece conhecer, antes do projeto de investigação estar razoavelmente avançado, pormenores dos resultados que serão alcançados com tal projeto. Se o resultado aparece rapidamente, ótimo. Se não, ele lutará com os seus instrumentos e com as suas equações até que, se for possível, forneçam-lhe os resultados que estejam conformes com o modelo que ele tinha previsto desde o começo. Não é só com o seu trabalho de investigação que o cientista mostra a sua firme convicção sobre os fenômenos que a natureza pode produzir e sobre as maneiras as quais eles podem se