A figura do bom selvagem

Do ponto de vista antropológico, Las Casas é mais coerente do que Sepulvera. No entanto, o massacre intelectual pode ser tão ou mais cruel do que o massacre com uso da força bruta. Isto devido ao fato de os "ataques" intelectuais atingem diretamente a maneira como um índio se vê no mundo. Todo o seu contexto de fé, meio de vida se confronta com a nova idéia. Pressionado pela força bruta do invasor o índio fica no meio do choque entre a sua cultura e a invasora que lhe diz - insistentemente (e até "prova") - que seu meio de vida, sua fé e tudo o mais não são a expressão da realidade, não é o que Deus espera dele. Ocaminho escolhido por ele para viver é incorreto. Conclusão: cria-se um zumbi, uma pessoa sem vida visto que ele perde a capacidade de acreditar em qualquer coisa, até mesmo sua cultura.

A antropologia estuda o homem mas, ao que parece, não faz a pergunta fundamental "O que é o homem?". Preocupa-se em análises sobre índios e a covarde perseguição que sofreram em séculos passados. Parece esquecer que isto ainda perdura. A diferença é que não se perseguem índios, mas o próprio "homem branco". O processo é mais ou menos este: "Se você tem computador, carro novo, celular de última geração, você é aceito. Caso contrário, você é um "selvagem", uma pessoa de pouca instrução, preguiçosa e despreocupada (o mesmo pensamento antes destinado aos índios) e, por isso, não se "encaixa" na "sociedade moderna". Mais, nos convenceram que não existe vida possível sem um computador. O resultado disso é um afastamento das pessoas em suas relações interpessoais. Tudo é feito através de uma tela. O problema disso é que, cada vez mais, perde-se a referência do "humano" algo como "Por que eu vou me preocupar com aquele sujeito, se ele nem está no meu orkut? Não o conheço, não tenho nada com vida dessa pessoa"