A Fe E A RAZaO
Tínhamos um sonho, o sonho da pureza total, tudo o que fosse considerado sujo deveria ser eliminado: vírus, bactérias, vermes e parasitas, inclusive qualquer pessoa que viesse a ferir a nossa escolha de sermos limpos. Sujeira é uma palavra que vibra negativamente. Lembra doenças, pobreza, miséria, descaso, abandono e, certamente nós que podemos comprometer o nosso bem-estar nos misturando a ela, precisamos de todos os recursos modernos para combatê-la.
As favelas, por exemplo, são locais de muita criminalidade. Lá vivem pessoas convivendo com muita sujeira, ratos e fezes que bóiam nos córregos que passam no fundo de suas moradias. Este é o exemplo de uma das maiores imundices da humanidade e também o maior exemplo da nossa vontade em extirpar todas as pessoas que podem interferir na nossa nobre qualidade de vida. Quem mora em favela já é segregado socialmente só pelo fato de ser favelado, um conceito que já o define como indivíduo. Não importa seu nome ou virtudes que tenha, antes de tudo ele será sempre um favelado. Será uma pessoa suja que para ser aceita por seus semelhantes deverá passar pelo crivo de uma série de instituições como escolas, igrejas, hospitais e prisões, até que ele mesmo possa se convencer de que é necessário tornar-se uma pessoa limpa.
Este sonho não se tornou realidade porque graças ao Universo entrópico, a sujeira não fica quietinha no seu lugar preestabelecido, acaba voltando e, lamentavelmente mistura-se novamente entre todos nós, os agentes da limpeza, sempre reconhecidos entre si pela brancura impecável. Não se pode eliminar uma sujeira inexistente que só incomoda aqueles que se preocupam com o seu próprio umbigo.
Parece que somos livres porque decidimos viver na brancura. Mas nunca fomos tão prisioneiros quanto agora porque somos prisioneiros de nós mesmos. O que vale mais, um futuro seguro e regrado ou um futuro inseguro e sem regras? As incertezas para o amanhã estão deixando o homem desesperado, ninguém se