Velho do restelo
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Mas um velho, de aspecto venerando, que ficava nas praias, entre a gente, postos em nós os olhos, meneando três vezes a cabeça, descontente, a voz pesada um pouco alevantando, que nós no mar ouvimos claramente,
Cum saber só de experiências feito, tais palavras tirou do experto peito:
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"Ó glória de mandar, ó vã cobiça desta vaidade a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça c'ua aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas, que crueldades nele experimentas!"
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"Dura inquietação da alma e da vida fonte de desamparos e adultérios, sagaz consumidora conhecida de fazendas, de reinos e de impérios!
Chamam-te ilustre, chamam-te subida, sendo digna de infames vitupérios; chamam-te Fama e Glória Soberana, nomes com quem se o povo néscio engana!"
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"A que novos desastres determinas de levar estes Reinos e esta gente?
Que perigos, que mortes lhe destinas, debaixo dalgum nome preminente?
Que promessas de reinos e de minas d' ouro, que lhe farás tão facilmente?
Que famas lhe prometerás? Que histórias?
Que triunfos? Que palmas? Que vitórias?"
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"Não tens junto contigo o Ismaelita, com quem sempre terás guerras sobejas?
Não segue ele do Arábio a lei maldita, se tu pela de Cristo só pelejas?
Não tem cidades mil, terra infinita, se terras e riqueza mais desejas?
Não é ele por armas esforçado, se queres por vitórias ser louvado?"
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"Deixas criar às portas o inimigo, por ires buscar outro de tão longe, por quem se despovoe o Reino antigo, se enfraqueça e se vá deitando a longe; buscas o incerto e incógnito perigo por que a Fama te exalte e te lisonje chamando-te senhor, com larga cópia, da Índia, Pérsia, Arábia e da Etiópia."