Um sentido para a vida
Frei Betto
Minha intenção é falar sobre o momento que estamos vivendo, momento confuso em termos de perspectiva de futuro. A primeira evocação que faço é da pintura de Michelangelo na Capela Cistina. “A criação de Adão”, em que a figura de Deus, recoberto de mantos e com a barba longa, estende o dedo para Adão. Ao mesmo tempo em que Adão, como símbolo da humanidade, é atraído em direção à terra, ele estende o dedo na direção do Criador, espécie de premonição nostálgica de que é preciso não perder o contato com a fonte, com a raiz que é Deus. Michelangelo foi genial, porque é muito difícil compreender o momento em que se vive. É fácil analisar os momentos depois que eles passaram. O artista, com sua intuição, com seu talento, tem o dom de captar o momento, que depois a epistemologia e a filosofia tentam explicar.
O que acontecia naquele momento da “descoberta da América”, da “descoberta” do Brasil? A passagem. Diria que não estamos vivendo uma época de mudanças. Estamos vivendo, hoje, uma mudança de época. A última mudança de época foi justamente na “descoberta” da América, quando o ocidente passou do período medieval para o moderno. A pintura de Michelangelo expressa, com genialidade, essa chegada de um tempo em que o conhecimento, a epistemologia, se desloca de uma perspectiva teocêntrica para uma perspectiva antropocêntrica. A rainha das ciências, durante mil anos, no período medieval, foi a teologia. A rainha das ciências, da modernidade é a física. O período medieval se baseava na fé; o moderno, na razão. O período medieval se baseava na contemplação das verdades reveladas; o moderno, na busca da compreensão da mecânica deste mundo e no pragmatismo, na transformação deste mundo.
Quando os camponeses medievais preparavam o campo, aspergiam água benta e ainda pagavam aos padres pela água comprada. Até que apareceu um sujeito, que não era cristão, com um pozinho preto dizendo: “Ponham isso na