Um Conto Sobre A Fulga De Alcatraz

Um conto sobre a fuga de Alcatraz
A condenação foi um ultraje. Arrancaram-me das entranhas onde eu me escondi e roubei toda vida alheia que podia. Abriram com um corte o meu refúgio, não respeitaram o meu desejo pelo sangue e pela escuridão. Sem sensibilidade alguma, com a frieza de um doutor diplomado que faz o seu trabalho e ganha alguns trocados, o oficial de máscara, luvas de borracha e roupa verde não questionou se não seria simplesmente preferível me deixar ali, à própria sorte.
Tudo muito cordial e pomposo. Pareciam até civilizados, não fosse por aquela claridade toda em meus olhos miúdos. Poderiam, mas nunca me enganaram.
Antes que eu pudesse esboçar qualquer reação natural e humana, preferi não chorar. Abri a boca e berrei, urrei como um animal que estava a ser abatido. E não foi de tristeza. Era raiva que latejava em mim, desde cedo.
Lá estava eu na Rocha. Bem-vinda. Aqui você pode tudo, menos sair.
Colocaram-me um uniforme, torturavam-me com sons e imagens para condicionar meus sentidos. Disseram que era educado dizer oi. Tudo que foi proclamado apenas como desejável, logo se tornava ordem. Prioridades e mais prioridades, convenções, castigos, tudo muito bem disfarçado e devidamente comemorado. Muita celebração. Dança, bebida, fartura.
No dia seguinte cada um por si. Com sua venerável posição e função social.
Em Alcatraz todos se sentiam satisfeitos.
Menos eu, era a minha prisão. Por quê? Por quê? Por quê?
Fizeram-me cantar diversos hinos que não significavam nada. Tive de lidar com generais sádicos a cada dia. Logo aprendi a ser masoquista para sobreviver. Era uma ajuda mútua. Eles precisavam de mim para se sentir bem em algum aspecto, já que faziam parte de Alcatraz e lá a única verdade era a felicidade.
No fim das contas, eu precisava deles para que me ferissem o quanto pudessem. Quanta inocência. Quanta inocência. Cheguei a acreditar que ao colaborar seria liberta assim que possível, pois deveria haver algum engano.
Eu sonhava que poderia algum dia