Texto Filosofia
A consciência mítica se transforma em religiosa quando se dá uma institucionalização dos mitos em um sistema doutrinário das crenças, acompanhado de uma organização hierárquica de profissionais da crença, de forma que, em torno das crenças, se ergue um verdadeiro empreendimento sócio-cultural que é uma religião. Os mitos não possuem este grau de sistematização e organização.
É necessário deixar bem claro, nesta tentativa de conceituar o mito, que o mesmo não tem a conotação usual de fábula, lenda, invenção, ficção, mas a acepção que lhe atribuíam e ainda atribuem as sociedades arcaicas, as impropriamente denominadas culturas primitivas, onde mito é o relato de um acontecimento ocorrido no tempo primordial, mediante a intervenção de entes sobrenaturais. Em outros termos, mito, é o relato de uma história verdadeira, ocorrida nos tempos dos princípios, quando com a interferência de entes sobrenaturais, uma realidade passou a existir, seja uma realidade total, o cosmo, ou tão-somente um fragmento, um monte, uma pedra, uma ilha, uma espécie animal ou vegetal, um comportamento humano. Mito é, pois, a narrativa de uma criação.
De outro lado, o mito é sempre uma representação coletiva, transmitida através de várias gerações e que relata uma explicação do mundo. Mito é, por conseguinte, a palavra "revelada", o dito. E, desse modo, se o mito pode se exprimir ao nível da linguagem, ele é, antes de tudo, uma palavra que circunscreve e fixa um acontecimento. O mito expressa o mundo e a realidade humana, mas cuja essência é efetivamente uma representação coletiva, que chegou até nós através de várias gerações. E, na medida em que pretende explicar o mundo e o homem, isto é, a complexidade do real, o mito não pode ser lógico: ao revés, é ilógico e irracional. Abre-se como uma janela a todos os ventos; presta-se a todas as interpretações. Decifrar o mito é, pois, decifrar-se. E, importante destacar que, o mito não pode ser um objeto, um conceito ou uma