Teatro Portugues
SINHAZINHA MOTA- O senhor mesmo que é o Pestana? Desculpa meus modos mas é mesmo o senhor?
Vexado, aborrecido, Pestana respondeu que sim, que era ele. Vinha do piano, enxugando a testa com o lenço, e ia a chegar à janela, quando a moça o fez parar. Não era baile, apenas um sarau íntimo, pouca gente, vinte pessoas ao todo, que tinham ido jantar com a viúva Camargo, rua do Areal, naquele dia dos anos dela, cinco de novembro de 1875...
PESTANA- Sim, sou eu mesmo!
SINHAZINHA MOTA- Você poderio tocar algumas quadrilhas?
Pestana fez uma careta, mas dissimulou depressa, inclinou-se calado, sem gentileza, e foi para o piano, sem entusiasmo.
(Acaba a musica vem um figurante e fala)
FIGURANTE 1- Toca mais uma Pestana?
PESTANA - Sim.
(Acaba a musica vem um figurante e fala)
FIGURANTE 2- Toca mais uma Pestana? (Voz meiga)
(Pestana começa a tocar)
FIGURANTE 3- E ai Pestana toca mais uma?
PESTANA - Não! ( joga sua toalha e saia da casa)
PESTANA - Licença pessoal estou indo embora!
Alegando dor de cabeça pediu licença para sair. Nem elas, nem a dona da casa, ninguém logrou retê-lo. Ofereceram-lhe remédios caseiros, algum repouso, não aceitou nada, teimou em sair e saiu. Rua fora, caminhou depressa, com medo de que ainda o chamassem; só afrouxou depois que dobrou a esquina da rua Formosa. Em casa, respirou. Casa velha, escada velha, um negro velho que o servia, e que veio saber se ele queria jantar.
NEGRO- O que o senhor quer jantar?
PESTANA - Não quero nada, faça-me café e vá dormir.
Veio o café; Pestana engoliu a primeira xícara, e sentou-se ao piano. Olhou para o retrato de Beethoven, e começou a executar a sonata, sem saber de si, desvairado ou absorto, mas com grande perfeição. Repetiu a peça; depois parou alguns instantes, levantou-se e foi a uma das janelas. Tornou ao piano; era a vez de Mozart, pegou de um trecho, e executou-o do mesmo modo, com a alma alhures. Haydn levou-o à meia-noite e à segunda xícara de café.
Entre meia-noite e uma hora, Pestana