SONETO: INSPIRAÇÃO E LABOR
Jaime Adilton Marques de Araújo
Dentre os mais antigos debates, capazes de gerar inacabáveis grupos de estudo e discussões, está, sem dúvida alguma, a árdua tarefa literária dos poetas. Há quem pense que se trata tão-somente de inspiração, enquanto que outros julgam que tudo não passa de esforço e trabalho, casado com uma certa habilidade na arte de versejar. Em se tratando do soneto, esta discussão ganha ainda mais importância, pelo esforço requerido de seus cultores para atender a um modelo que é, a um tempo, exigente e sintético.
Inspiração! Os arroubos dos poetas de todas as épocas, fazendo petições às musas e aos deuses e rendendo-lhes homenagens, justificam essa crença generalizada de que, sobre as suas cabeças, há um halo inapagável que os liga a uma fonte inspiradora.
Como exemplos, citamos dois poetas famosos, de muitos que poderiam ser juntados, para respaldar a afirmação: No poema Navio Negreiro – Tragédia no mar. Antônio Frederico de Castro Alves (1847/1871), nosso “Poeta dos Escravos”, instava sua musa a que se fizesse presente num momento poético, para que falasse por ele na denúncia à degradação humana:
Dize-o tu, severa musa,
Musa libérrima, audaz!...”
E mais adiante, no mesmo poema, ordena que ela se cale e chore diante da trágica imagem de negros acorrentados:
Silêncio, Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto!...”
Outros exemplos, recolhemo-los de Luis de Camões (1525?/1580), que ora invoca as Tágides (ninfas do rio Tejo), pedindo-lhes inspiração, ora, contrariado, pede que a Musa pare de inspirá-lo:
E vós, Tágides minhas, pois criado
Tendes em mim um novo engenho ardente,
Se sempre em verso humilde celebrado
Foi de mim vosso rio alegremente,
Dai-me agora um som alto e sublimado,
Um estilo grandíloquo e corrente,
Porque de vossas águas Febo ordene
Que não tenham inveja às de Hipocrene.
Os Lusíadas, Canto I, 4
Não mais, Musa, não mais, que a lira tenho