Sociologismo juridico
Notas de uma discussão
1. Introdução
Todo texto tem uma história. Este é uma continuação de um debate ocorrido numa sala de aula com uma turma do curso de direito. A cadeira era sociologia jurídica. O debate era sobre os pontos de contato, de divergência, de cooperação entre essa disciplina e a dogmática jurídica — aqui entendida no sentido de estudo sistemático (e também intra-sistemático) das normas que compõem o chamado Direito Positivo (Reale, 1978, p. 160). Um dos pontos tocados abordou a questão da legitimidade da lei. Implícita à discussão havia o pressuposto, praticamente consensual dentro do mundo moderno, de que a lei mais legítima — e também a mais eficaz — é aquela que mais corresponde às necessidades e aspirações dos cidadãos (Bobbio, 1967). Por aqui se vislumbrava um terreno em que a sociologia jurídica poderia contribuir para tornar a ordem jurídica positiva mais legítima, na medida em que, com seus métodos e técnicas de sondagem do real, a ela caberia esclarecer o que é que os cidadãos mais necessitam e a que aspiram.
Aqui se marcavam dois campos, dois métodos, dois programas. A dogmática jurídica, estudando o direito “de dentro”, tinha por finalidade adestrar os juristas encarregados de aplicá-lo; a sociologia jurídica, estudando o direito “de fora”, tinha por finalidade verificar a sua adequação à realidade empírica e, sendo o caso, propor a sua modificação. Surgiu um exemplo bem singelo mas, por isso mesmo, bastante ilustrativo: a questão do jogo do bicho. Apesar de “ilegal”, ele tem uma legitimidade social bastante forte — para não dizer unânime, que é uma palavra sempre perigosa. Nesse caso, uma enquete sociológica, talvez desnecessária, muito provavelmente apontaria no sentido de sua legalização. O princípio implícito na nossa discussão — o de que a lei legítima é a lei socialmente desejada — passava, com esse exemplo, pelo teste da prova empírica, e com nossa aprovação.
Mas, logo, a