sociologia
Da noção retórica de ethos à análise do discurso
Ruth Amossy
Todo ato de tomar a palavra implica a construção de uma imagem de si. Para tanto, não é necessário que o locutor faça seu auto-retrato, detalhe suas qualidades nem mesmo que fale explicitamente de si. Seu estilo, suas competências lingüísticas e enciclopédicas, suas crenças implícitas são suficientes para construir uma representação de sua pessoa. Assim, deliberadamente ou não, o locutor efetua em seu discurso uma apresentação de si. Que a maneira de dizer induz a uma imagem que facilita, ou mesmo condiciona a boa realização do projeto, é algo que ninguém pode ignorar sem arcar com as conseqüências. As entrevistas que determinam a escolha de um candidato para um cargo, os comícios eleitorais, as relações de sedução, todas as declarações em que a imagem do locutor implica riscos concretos, vêm nos lembrar desse fato. A apresentação de si não se limita a uma técnica apreendida, a um artifício: ela se efetua, freqüentemente, à revelia dos parceiros, nas trocas verbais mais corriqueiras e mais pessoais. Parte central do debate público ou da negociação comercial, ela também participa dos
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Imagens de si no discurso
diálogos entre professor e alunos, das reuniões de condôminos, da conversa entre amigos, da relação amorosa.
Os antigos designavam pelo termo ethos a construção de uma imagem de si destinada a garantir o sucesso do empreendimento oratório.
Lembrando os componentes da antiga retórica, Roland Barthes define o ethos como “os traços de caráter que o orador deve mostrar ao auditório (pouco importando sua sinceridade) para causar boa impressão: é o seu jeito [...]. O orador enuncia uma informação e ao mesmo tempo diz: sou isto, não sou aquilo”.1 O autor retoma assim as idéias de Aristóteles, que afirmava em sua Retórica: “É [...] ao caráter moral que o discurso deve, eu diria, quase todo seu poder de persuasão”.
Privilegiando o emprego do enunciado em