ser cidadão em tempos dificeis
É que "democratização" da sem-vergonhice que vem tomando conta do país, o desrespeito à coisa pública, a impunidade se aprofundaram e se generalizaram tanto que a nação começou a pôr-se de pé, a protestar. Os jovens e os adolescentes, também, vêm às ruas, criticam, exigem seriedade e transparência. O povo grita contra os testemunhos de desfaçatez.
(...) Por outro lado, sem sequer poder negar a desesperança como algo concreto e sem desconhecer as razões históricas, económicas e sociais que a explicam, não entendo a existência humana e a necessária luta para fazê-la melhor, sem esperança e sem sonho.
Paulo Freire, 1992.
Embora o texto e o contexto de que fala Paulo Freire sejam diversos da nossa situação, estes servem de pedra de toque para repensar a nossa realidade. Estamos fartos de exploração e mal-estar sociocultural, queremos justiça e paz, mas as nossas rotinas, não interrogadas, não permitem uma luta eficaz e fecunda contra a indiferença e o conformismo. A radiografia do país é de todos conhecida ? Desertificação do interior, superpopulação dos grandes centros urbanos, migrações, guetos, grupos desprotegidos (pobres, desempregados, imigrantes, deficientes, etc.) ? e as políticas pró-activas de inclusão não criam condições de cidadania. Ao contrário, assistimos a formas de controlo, domesticação, silenciamento e exclusão socioeconómica ? produção de cidadãos sem cidadania ? que impedem o pensamento crítico e a participação democrática. Com cortes na educação, saúde e cultura e sem espaços e tempos de aprendizagem da democracia, os motins étnicos, os fluxos migratórios e a revolta do interior profundo podem surpreender as nossas consciências adormecidas.
É imprescindível um processo de consciencialização individual e colectivo, local e mundial para que as nossas vidas e a das outras pessoas sejam de cidadania plena. Ser cidadão é ser pessoa, é ter direitos e deveres, é assumir as suas liberdades e