senha
A homogeneidade lingüística não é, como fazem crer as ideologias nacionais, uma característica natural das nações que remete a tempos imemoriais. A unidade sob uma só língua é construída através de um complexo processo. E assim como as próprias nações da Europa Ocidental precisaram passar por esse processo de criação e naturalização da homogeneidade lingüística, também os países que importam esse modelo precisam resolver seus dilemas lingüísticos internos. Que língua utilizar na educação e na administração? Como criar, por meio da língua, a imagem de um Estado único e indivisível?
Na construção da unidade lingüística, é preciso ainda que o Estado-nação em formação desfrute de uma língua escrita devidamente padronizada. Seria certamente uma falácia afirmarmos que a escrita é essencial para o desenvolvimento de uma forma de governo relativamente complexa. Contudo, para um tipo particular de Estado, o Estado burocrático, ela se mostra de importância crucial. O sistema burocrático moderno é altamente dependente da escrita para a realização das atividades administrativas, seja para comunicar-se à distância, arquivar informações ou mesmo para despersonalizar interações (cf. Goody 1996:89-92).
Em primeiro lugar, vale relembrar que a homogeneidade lingüística enquanto condição para a construção da unidade nacional é uma idéia que deriva diretamente de um modelo ocidental de Estado-nação. Assim como, no contexto original de surgimento desse modelo de organização sociopolítica, a unidade pela língua precisou ser cuidadosamente construída, também no caso cabo-verdiano ¾ inspirado pelo primeiro ¾ essa construção se apresenta como uma meta fundamental a ser alcançada.
Outra importante questão a ser considerada é que, embora o discurso elaborado pelos autores aqui analisados preconize a redução da heterogeneidade lingüística e social, preservando a unidade nacional, ele acaba por produzir e reproduzir importantes fatores de desigualdade