Sahlins
ENSAIO BIBLIOGRÁFICO
SOBRE MARSHALL SAHLINS E AS
“COSMOLOGIAS DO CAPITALISMO”
Marcos Lanna
SAHLINS, Marshall. 1988. “Cosmologies of Capitalism: The Trans-Pacific
Sector of the ‘World System’”. Proceedings of the British Academy,
LXXIV:1-51.
O presente estudo oferece uma leitura crítica de “Cosmologias do Capitalismo”, de Marshall Sahlins. O retorno a este artigo de 1988 se justifica pela posição central que ocupa na obra de Sahlins, pois incorpora a reflexão sobre a história apresentada anos antes (Sahlins 1981; 1985), retoma a crítica à razão prática (Sahlins 1976) e, ao mesmo tempo, anuncia reflexões mais recentes sobre o pensamento ocidental (Sahlins 1993a; 1993b;
1996; 1997; 1998). Além disso, ao centrar-se nas trocas, sofistica a perspectiva de Stone Age Economics (Sahlins 1972). Meu objetivo aqui é avaliar as contribuições do autor, por meio de uma crítica que assume uma perspectiva interna à sua obra.
Originalmente uma “Radcliffe-Brown Lecture” (Sahlins 1988b), o artigo em questão demonstra, contra Radcliffe-Brown, quão fecundo pode ser o estudo da história de sociedades indígenas. Para tanto, Sahlins analisa três sociedades — Havaí, Kwakiutl e China —, localizadas no “setor transpacífico do sistema mundial” e interligadas, desde o final do século
XVIII, por um sistema de trocas, envolvendo populações nativas e mercadores ocidentais. Nesse contexto de contato, as sociedades havaiana, chinesa e kwakiutl são apresentadas como autoras de sua própria história e não como vítimas do capitalismo. O argumento é que suas posições no sistema mundial, já então globalizado, não eram passivas, mesmo quando enfrentavam graves crises demográficas.
Para construir o argumento, Sahlins evita reduzir a história daqueles povos a uma função das “condições materiais”. Expande, assim, uma interpretação de Marx e da noção de práxis, baseando-se no Pensamento
Selvagem de Lévi-Strauss, interpretação esta que já fora apresentada