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Na sua simplicidade, a fila é um dos melhores, se não for o melhor, exemplos de como operam os limites numa democracia. Seus princípios são simples e reveladores: quem chega primeiro é atendido em primeiro lugar. Numa fila, portanto, não vale o oculto. Ou temos uma clara linha de pessoas, umas atrás das outras, ou a vaca vai para o brejo. Quando eu era menino, lembro-me bem como era impossível ter uma fila no Brasil. As velhas senhoras e as pessoas importantes (sobretudo os políticos) não se conformavam com suas regras e traziam como argumento para serem atendidos, passando na frente dos outros, ou a idade, ou o cargo, ou conhecimento com quem estava atendendo, ou algum laço de família. Afinal quem vai deixar a vovó esperando para depois tomar uma bronca em casa? Hoje, sabemos que idosos e deficientes não entram em fila. Mas estamos igualmente alertas para o fato de que um cargo ou um laço de amizade não faz de alguém um supercidadão com poderes ilimitados junto aos que estão penando numa fila por algumas horas. O princípio do quem primeiro chega é primeiro atendido revela uma outra dimensão da democracia e dos limites que deve ser igualmente discutida.
Refiro-me ao fato de que a fila anda (ou deve andar!). Ela é construída, como tudo que é governado por regras simples e conhecidas de todos, pelo princípio da rotatividade. Se “a fila anda”, ela faz com que o último acabe em primeiro e quem estava na frente seja obrigado a sair depois de ter sido atendido. Mais: se ele (ou ela) quiser voltar, vai para o “fim da fila”. Ora, isso não é um belo exemplo dos limites que tornam todos iguais, fazendo-os primeiros ou últimos e, consequentemente, tornando o primeiro e o último relativos? Numa hora e em dado lugar sou o primeiro, noutro sou um cara comum e apenas sigo as normas gerais da cidadania. Mas sei — e esse é um ponto capital — que, mesmo em primeiro lugar ou no último, tenho limites,