resenha
Paola Basso Menna Barreto Gomes Zordan
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Bruxas: figuras de poder
Resumo: As mulheres que tanto a história como a imaginação popular mitificaram como “bruxas” constituem figuras que expurgam as fobias da Contra Reforma. As bruxas foram torturadas e queimadas para sinalizar os perigos de práticas e saberes à margem da Igreja e de outras instituições dominantes na Idade Moderna. Parteiras, curandeiras e carpideiras, as bruxas misturam em seu caldeirão os mistérios da vida e da morte herdados das tradições pagãs.
Este artigo percorre textos de historiadores, em especial o de Jules Michelet, que no século XIX construiu a imagem romântica e martirizada da bruxa, e o manual de inquisidores do século
XIV, o Malleus Maleficarum, que descreve os poderes da bruxa, sua aliança com o demônio e sua ameaça para o cristianismo. Os discursos instaurados por tais textos constroem tanto a imagem que glorifica a bruxa quanto aquela que a execra, mostrando ambas o potencial transformador de suas práticas e de sua ligação com a sexualidade.
Palavras-chave: bruxas, corpo, feitiçaria, paganismo, Inquisição.
Copyright 2005 by Revista
Estudos Feministas
Escrito pelos inquisitores Heinrich
Kramer e James Sprenger, foi incansavelmente consultado nos tribunais eclesiásticos dos séculos precedentes nos processos de bruxaria (SPRENGER e KRAMER,
1991).
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Fêmea inebriante ou velha decrépita, a figura da bruxa exprime alguns conceitos que o pensamento ocidental legou ao que se entende por feminino. Trata-se de uma imagem construída por diferentes discursos, um romântico, propagado ao longo do século XIX, e outro eclesiástico, expresso nos enunciados seculares da cristandade contra arcaicas práticas pagãs. A fim de mostrar a constituição dessa imagem, o presente ensaio se pauta, entre tantas leituras, no manual de inquisidores, datado do século XIV, chamado Malleus Maleficarum,1 o
“Martelo das Feiticeiras”,