Resenha Estamira
Laura Lúcio Salles 03.07.2013
O documentário “Estamira”, dirigido e produzido por Marcos Prado, trata da vida de Estamira, uma mulher já idosa e que, há vinte anos trabalha num aterro Sanitário chamado Jardim Gramacho, no Rio de janeiro. Ela aparenta gostar daquilo que faz, pois inúmeras vezes diz que ali encontrou sua felicidade e não viveria sem o lixão.
Ela é classificada por sua família e também por psiquiatras como louca ou doente mental. Para Foucault, o diagnóstico de Estamira tem caráter social e cultural: o filme trata de uma doida a partir dos conceitos de normalidade –ou de loucura- da nossa sociedade. Como uma doida, suas frases podem ser analisadas como meros delírios. Estamira, porém apresenta alternâncias entre momentos de abstração e momentos em que vive a realidade. Pensar sobre o a loucura e sobre o que faz de um ser humano um “louco” é uma das questões trazidas pelo filme.
Uma das filhas de Estamira depõe no documentário que sua mãe ficou “assim” depois que foi estuprada duas vezes. Nesse momento Estamira perdeu a fé em Deus - tomou consciência que mesmo aqueles que seguem os ensinamentos divinos não estão imunes aos infortúnios da vida - e passou a ter um espírito questionador acerca de tudo a sua volta. A partir daí, ela passa a acreditar em verdades que ela mesma cria, como quando diz estar em todo lugar, ser perfeita e ser a visão de cada um. No meio dessas verdades ela faz reflexões que podem ser interpretadas mediante a vida desgraçada que lhe foi reservada - tendo em vista que sofreu desde criança abusos sexuais, se prostituiu, teve dois casamentos nos quais foi traída e lida com o arrependimento de ter internado a mãe forçosamente numa clínica psiquiátrica - como uma indignação com a sua realidade, que lhe foi de certa forma imposta.
O documentário traz a tona críticas sociais à sociedade de consumo e a exclusão social sofrida por aqueles que, como a protagonista, catam lixo.