Resenha crítica
Resenhado por Sérgio Adorno, do Núcleo de Estudos da Violência (NEV/Cedip - Universidade de São Paulo)
Diz-se freqüentemente que não há pesquisa sobre crime e violência no Brasil, que pouco se sabe sobre o que se passa na "mente dos criminosos" e que as agências encarregadas do controle repressivo da ordem pública prescindem de informações científicas que aumentem sua eficiência operacional. Nada pode ser mais equivocado. Este belo livro de Alba Zaluar constitui flagrante exemplo da falácia de tais crenças e preconceitos.
Resultado de mais de duas décadas de rigorosa pesquisa de campo, orientada por sólida formação antropológica e sociológica, a obra de Alba Zaluar é pioneira por haver colocado em debate público os efeitos provocados pela emergência e rápida expansão do crime organizado -- em especial, o narcotráfico internacional -- como responsável por fatos novos vividos pela sociedade brasileira.
Em 14 capítulos, este livro passa em revista os principais argumentos que povoam o imaginário da opinião pública e, em particular, dos cientistas sociais. Examina detidamente teses clássicas que supõem "causas da violência" como pobreza e desemprego, crise da família, escolarização insuficiente, surgimento de gangues e a natureza "não-humana" dos delinqüentes.
Discute as relações entre democracia, cidadania e violência, o papel das agências encarregadas da lei e da ordem, o lugar da cultura popular na produção das imagens sobre crime, criminosos e criminalidade. Explora classes sociais urbanas atravessadas pelos conflitos nascidos da circulação, comércio e consumo de drogas. Critica as matrizes teóricas que sustentam as interpretações correntes na miríade de facções políticas da esquerda à direita. Comenta a produção e a qualidade dos dados oficiais disponíveis.
A dureza dos fatos narrados não conduz a antropóloga a uma visão melancólica. Ao contrário, há saídas,