Reparações: a memória presentificada em meio aos ressentimentos.
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REPARAÇÕES: A MEMÓRIA PRESENTIFICADA EM MEIO AOSRESSENTIMENTOS.
IVALDO MARCIANO DE FRANÇA LIMA
As reparações constituem-se, na atualidade, em ponto obrigatório para qualquer debate que envolva uma análise mais sóbria das relações raciais em nosso país. A meu ver, as reparações implicam no direito à memória, na luta para que o ocorrido em um passado distante se transforme em monumento no presente, e desta forma não seja esquecido, e ao mesmo tempo corrigido (ou reparado). Para um historiador que tenha um mínimo de discernimento teórico, o uso das relações possíveis entre a História e a
Psicanálise se constitui como fundamental para o entendimento da questão acima colocada (CERTEAU: 2011). Mas, afinal de contas, quais os elos que me levam a afirmar que as reparações, enquanto fenômeno do presente, seja compreendido sob uma base que se justifique a partir dos dois campos do conhecimento acima citados? Antes de tudo, estou me referindo a duas questões bastante tensas e conflituosas. Como diria
Marc Ferro (2009) em relação ao ressentimento, há uma memória do passado que é celebrada a partir dos sofrimentos do presente e que se justifica na relação simplificada entre escravidão (o acontecido) e o racismo/discriminação racial (o que acontece). Há, antes de tudo, uma complexa construção de uma África mítica por parte de diferentes setores dos movimentos negros organizados, e que se apóia numa relação tensa e próxima do “desejo ao retorno ao útero da mãe”. Tal questão foi apontada em célebre obra de Stuart Hall (1996, ver também 2003), que indica ser esta questão, a do desejo ao retorno, a chave para entender as razões para esta idealização de uma África mítica, baseada nos pressupostos da homogeneidade e unicidade, elementos difíceis de serem encontrados no continente africano propriamente dito. A África, o lugar que ocupa no imaginário e na construção de identidades, tem sido objeto de algumas discussões por diversos intelectuais brasileiros.