Religião e cultura
1. Os Conceitos e seus limites
a) Cultura
Geralmente se conceitua cultura a partir da natureza. Cultura é o que se cultiva. Essa concepção foi herdada do pensamento alemão. Já Freud reflete a partir do conceito de separação: o ser humano se elevou quando se separou da condição animal. Quando ocorreu a distinção, começou a cultivar, a criar, a cultuar, a fazer cultura.
No sentido de separação e domínio da natureza, a cultura tende a se revelar como produção humana que forja um novo modo de viver e entender a vida. Há, entretanto, um limite emergente. A natureza não pode ser totalmente dominada e muito menos vencida. Terremotos, secas, maremotos e furacões ameaçam a estabilidade geral. Doenças e mortes revelam a impotência de toda cultura diante do fim de todo ser humano. As tragédias e a morte, portanto, entram na ordem do não-sentido, da falta de algo que dê significado e direção para todas as culturas.
É partindo desse conceito de “falta” que se constata como a natureza se ergue majestosa contra a experiência humana que deseja ser perene e estável. Os fatos naturais deixam os seres humanos desamparados. Em decorrência, nasce a necessidade de cultivar uma relação com o transcendente, com o que está além da realidade visível e que não pode ser controlável. Nesse sentido, toda cultura tem, na essência, um sentido religioso.
Diante dessa constatação é possível conceituar, limitadamente, o vocábulo cultura. Trata-se de um complexo orgânico com posturas e comportamentos existenciais práticos (ethos) e uma visão teórica de mundo. E, se toda cultura tende a reunir pessoas que partilham suas experiências cotidianas, pode-se dizer que a cultura é religiosa porque possibilita a aproximação de pessoas que alimentam crenças comuns. Ela também estabelece uma relação intrínseca com a religião quando propõe a releitura de fatos, gestos e expressões da vida humana de acordo com parâmetros que dependem de crenças e valores.