Religi O Na Educa O
“A religião, como os seus defensores estão no hábito de nos dizer, é a fonte do sentimento de obrigação social. Quando um homem fazia alguma coisa que desagradava aos deuses, estes tendiam a castigar, não apenas o indivíduo culposo, mas toda a tribo. Por conseguinte a sua conduta era uma questão de preocupação colectiva, uma vez que os vícios privados davam origem a calamidades públicas. Este ponto de vista ainda hoje domina o código penal. Há certas anormalidades sexuais pelas quais os homens são encarcerados, embora de um ponto de vista racional o seu comportamento apenas a eles diga respeito; se se quiser tentar qualquer justificação para o seu castigo, temos de nos basear no que aconteceu às Cidades da Planície, uma vez que só assim pode dizer-se que a sua conduta tem algo a ver com a comunidade. Facto curioso: as coisas que merecem a objecção dos deuses raramente são coisas que pudessem causar grandes danos se não desencadeassem a ira divina. Levantam objecções a que um indivíduo coma carne de porco, ou carne de vaca, ou case com a irmã da sua falecida mulher; nos tempos do Rei David, Deus ofendeu-se com um censo, e matou tanta gente com uma peste que as estatísticas obtidas pelo Rei David ficaram sem qualquer valor. Os deuses dos aztecas insistiam na prática de sacrifícios humanos e de canibalismo antes de se decidirem a mostrar a sua vontade para com os seus adoradores. Não obstante, embora os códigos morais resultantes da religião tenham sido, geralmente curiosos, temos de admitir que foi a religião que lhes deu origem. E se considerarmos que alguma moralidade, seja ela qual for, é melhor que nenhuma, então temos de admitir que a religião tem sido uma força benéfica.”
Bertrand Russell,
Educação e Sociedade
, Livros Horizente, Lisboa, 1982, pp.
68-77.
http://www.filedu.com/brussellareligiaonaeducacao.html