QUE VIM EU FAZER AQUI? FAZENDO DO EL DORADO O MEU LUGAR
Valéria de Oliveira
Mario de Andrade em 1927, quando chegou à Rondônia efetuou o seguinte registro em seu diário:
“... Não... não se pode dizer que seja bonito não...Chãos péssimos de cerrado, matos fracos, alagadiços, pauis ainda negros, beirando o rio encachoeirado e apenas. Ninguém topa no caminho com Atenas nem com Buenos Aires. Ninguém terá para ver, depois de se lavar no hotel, alguma catedral de Burgos... Mas estes trilhos foram plantados sem os reis do Egito e sem escravos... Sem escravos?... Pelo menos em escravos matados a relho... Milhares de chineses, de portugueses, bolivianos, barbadianos, italianos, árabes, gregos, vindos a troco de libra. Tudo quanto era nariz e pele diferente andou por aqui deitando com febrinha na boca–da-noite para amanhecer no nunca mais. Que vim fazer aqui!.... Qual a razão de todos estes mortos internacionais que renascem na bulla da locomotiva e vêm com seus olhinhos de luz fraca me espiar pelas janelinhas do vagão?...”
Mario de Andrade, O Turista Aprendiz (1976)
Que vim eu fazer aqui? Foi a pergunta que muitíssimas vezes perturbou a minha alma nas noites quentes do eterno verão de Rondônia, ao longo dos últimos vinte anos. Eu que nasci em Petrópolis e que até então havia passado toda minha vida na região serrana do Rio de Janeiro. No entanto eu, como milhares de outros imigrantes que chegaram a este estado brasileiro, deixei meu lugar de origem em janeiro de 1987 seduzida pela propaganda governamental do “ Grande el Dorado” , encravado no seio da América do Sul, em plena Amazônia Ocidental brasileira. El Dorado que se traduzia para alguns na possibilidade literal e real de encontrar ouro nas águas do rio Madeira, para outros o ter o seu próprio pedacinho de chão ou de um emprego no setor público. Sem dúvida, para todos os que iam em busca de seu El Dorado particular, Rondônia significava a imagem legendária da terra