psicologo
Gabriel García Márquez
Texto publicado em Revista Número 200, Bogotá, novembro de 1986.
In: Gabriel García Márquez Prêmio Nobel de Literatura - Reportagens Políticas - Obra Jornalística 4 1974-1995, pp. 241-245. Editora Record. Pensando bem, a ideia surgiu há oito anos no hotel Caesar Palace de São Paulo, Brasil, quando puseram por baixo da porta de meu apartamento um exemplar de um matutino local com manchete em oito colunas: “Morreu o papa”. Indignado, liguei para o gerente e protestei: −É escandaloso que num hotel de cinco estrelas levem para um cliente, o jornal do mês passado.
− O senhor me perdoe − respondeu uma voz em português acostumada a tudo. − Mas é que o papa morreu outra vez.
O que o gerente queria dizer era certo. João Paulo I, o sorridente Albiano Luciani, eleito apenas 34 dias antes, morrera em sua cama na noite anterior. Os que nascemos tarde demais para ver o cometa Halley em 1910, e não tínhamos certeza do que veríamos passar outra vez em 1986, já tínhamos o consolo de viver um acontecimento mais raro do que um cometa: um dosa papados mais curtos da história. O que eu não podia imaginar era que antes de três meses teria uma entrevista extraordinária com seu sucessor, e ficaria encerrado com ele por breves minutos em seu escritório do Vaticano.
Eu fora a São Paulo naquela primavera austral de 1979 para pedir ajuda ao cardeal Paulo Evaristo Arns numa gestão relacionada com os desaparecidos da Argentina. A morte de João Paulo I este a ponto de estragar o encontro, pois o cardeal Arns teve de improvisar seu retorno a Roma naquele mesmo dia para a nova eleição, mas em nossa apressada entrevista ocorreu-lhe uma idéia caracteristicamente sua:
− Venha comigo a Roma e fale do assunto com o papa.
− Não há papa – eu disse.
− Na próxima semana haverá – ele disse. E qualquer que seja o eleito, será muito sensível à dor da América Latina.
Não viajei imediatamente, mas fui dois meses depois