Psicanálise e educação: uma transmissão possível
ISSN 1516-9162
REVISTA DA ASSOCIAÇÃO
PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE
5
EDITORIAL
A conjunção psicanálise e educação já conheceu inúmeras formas, desde aquela própria ao otimismo que assolou o movimento psicanalítico na década de vinte, confiante nos auspícios de uma educação psicanaliticamente esclarecida, conforme aos melhores ideais iluministas. Freud mesmo não pretendeu ocupar-se de tal tema, deixando- o ao encargo de sua filha, que, dedicando-lhe .a obra de toda sua vida., pôde, segundo ele afirma, compensar a falha paterna. A retórica de Freud, nesse caso, não deixa de ilustrar aquilo que faz questão tanto aos métodos educativos quanto à forma- ção do psicanalista: o fato de que, ao ensinar, o que se transmite é, justamente, o que falha, mais além de um saber.
Se a eclosão da segunda guerra fez, por um lado, arrefecer o otimismo no seio da psicanálise, por outro, resultou na expansão e difusão da teoria psicanalítica pelo mundo. A ciência judaica da Viena do início do século tornava-se patrimônio cultural da civilização ocidental. Seus conceitos mais caros passaram ao domínio público, sendo apropriados pelos discursos hegemônicos do saber. A junção psicanálise e educação recebia aí uma nova torção, onde a teoria psicanalítica via-se degradada numa psicologização das relações de aprendizagem.
Sem nutrir a esperança de que uma educação psicanaliticamente orientada venha livrar a infância de sua neurose, encontramo-nos constantemente com a solicita- ção, dirigida à psicanálise, de responder ao insabido da educação. Nesse terreno, não cabe furtar-se ao diálogo: diálogo que exige, contudo, recuperar e salvaguardar as distinções epistêmicas operantes num campo e noutro para, então, descortinar-se uma contribuição possível ao campo da educação a partir do seu atravessamento pela noção de sujeito de desejo que a psicanálise