Prova de literatura portuguesa
O CORTIÇO Amanhecera um domingo alegre no cortiço, um bom dia de abril. Muita luz e pouco calor. As tinas estavam abandonadas; os coradouros despidos. Tabuleiros e tabuleiros de roupa engomada saíam das casinhas, carregadas na maior parte pelos filhos das próprias lavadeiras que se mostravam agora quase todas de fato limpo; os casaquinhos brancos avultavam por cima das saias de chita de cor. Desprezavam-se os grandes chapéus de palha e os aventais de aniagem; agora as portuguesas tinham na cabeça um lenço novo de ramagens vistosas e as brasileiras haviam penteado o cabelo e pregado nos cachos negros um ramalhete de dois vinténs (...). Viam-se homens de corpo nu, jogando a placa com grande algazarra. Um grupo de italianos, assentado debaixo de uma árvore, conversava ruidosamente, fumando cachimbo. Mulheres ensaboavam os filhos pequenos debaixo da bica, muito zangadas, a darem-lhes murros, a praguejar, e as crianças berravam, de olhos fechados, esperneando (...). Um acontecimento, porém, veio revolucionar alegremente toda aquela confederação da estalagem. Foi a chegada de Rita Baiana, que voltava depois de uma ausência de meses, durante a qual só dera notícias suas nas ocasiões de pagar o aluguel do cômodo (...). Cercaram-na homens, mulheres e crianças; todos queriam novas delas. Não vinha em traje de domingo; trazia casaquinho branco, uma saia que lhe deixava ver o pé sem meia num chinelo de polimento com enfeites de marroquin de diversas cores. No seu farto cabelo, crespo e reluzente, puxado sobre a nuca, havia um molho de manjericão e um pedaço de baunilha espetado por um gancho. E toda ela respirava o anseio das brasileiras e um odor sensual de trevos e plantas aromáticas. Irrequieta, saracoteando o atrevido e rijo quadril baiano, respondia para a direita e para a esquerda, pondo à mostra um fio de dentes claros e brilhantes que enriqueciam a sua fisionomia com um realce fascinador. Acudiu quase todo o cortiço para recebê-la. Choveram abraços e as