Professor Catedrático
Análise Social, vol. xxxiii (146-147), 1998 (2.°-3.°), 497-538
Elites agrárias e crescimento económico na periferia portuguesa do século XIX: O exemplo do Alentejo na era liberal (1850-1910)**
I. INTRODUÇÃO
Ao Alentejo, a principal «região latifundista» portuguesa, tem sido atribuída uma trajectória histórica de decadência e atraso, cujas raízes remontariam aos primórdios da expansão portuguesa e ao início da «época moderna», marcada pela persistência de inultrapassáveis bloqueios estruturais e pelo imobilismo social, económico e cultural, que o «século das revoluções» não conseguiu vencer, antes consolidou, e que o século xx não foi capaz de corrigir. Este destino, aparentemente confirmado pelo facto de actualmente a região ser uma das mais pobres e atrasadas do país, foi continuadamente associado à persistência de uma elite regional de tipo «tradicional», isto é, uma elite pouco aberta à modernização e ainda menos ao desenvolvimento.
No entanto, a visão de um multissecular e inexorável percurso de atraso e empobrecimento relativo no contexto nacional não parece historiograficamente sustentável. A literatura dedicada à economia e sociedade alentejanas do séculos XVII e xviii não permite tal interpretação e constatou-se também
* Universidade de Évora.
** Este artigo integra-se no projecto de investigação «Elites portuguesas em contextos regionais: família, património e redes de interesses no Alentejo contemporâneo», apoiado pela
JNICT/FCT (projecto PCSH/CHIS/1002/95) e pelo CIDEHUS.UE. Uma primeira versão foi apresentada na sessão C23, «Les élites agraires et le développement régional en Europe du
Sud. Analyses comparatives (xix-xx siècles)», XII Congrés International d'Histoire
Économique, Madrid, 1998.
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Helder Adegar Fonseca que no período da pax liberal (1850-1900), uma etapa primordial da formação do Portugal contemporâneo, o Alentejo foi um dos contextos agrários que, no país, mais progrediram.