problemas
Amiraldo M. Gusmão Jr.
Introdução
Afirmo, portanto, que tínhamos atingido já o ano bem farto da Encarnação do Filho de Deus de 1348, quando, na mui excelsa cidade de Florença, cuja beleza supera a de qualquer outra da Itália, sobreveio a mortífera pestilência. Por iniciativa dos corpos superiores ou em razão de nossas iniqüidades, a peste atirada sobre os homens por justa cólera divina e para nossa exemplificação, tivera início nas regiões orientais, há alguns anos. Tal praga ceifara, naquelas plagas, uma enorme quantidade de pessoas vivas. Incansável, fora de um lugar para outro; e estendera-se, de forma miserável, para o Ocidente.1
A maioria dos livros sobre a Idade Média européia fala muito pouco ou quase nada sobre um fenômeno que marcou profundamente o continente e de certa forma deixou cicatrizes que permanecem até nossos dias, a terrível "morte negra", a pandemia de peste bubônica que assolou a Europa em meados do século XIV. Desta forma, procurei, neste artigo, inverter esta tendência e colocar a praga como o tema central, tentando mostrar que ela foi um fenômeno típico da época, tendo assumido as enormes proporções que assumiu devido a uma série de fatores tais como: condições precárias de habitação, higiene, superstições e principalmente ignorância. Em vista da dificuldade de obter documentos ou testemunhos originais sobre o período, baseei-me em diversos trabalhos que abordam o tema com maior ou menor profundidade. Uma exceção é oDecamerone, de Boccaccio, que fornece preciosas informações sobre a peste na Florença de 1348. Dividi o artigo em duas partes básicas. A primeira, que consiste de dois capítulos, descreve o espaço privado e as condições de higiene e alimentação na época, além de fornecer algumas informações sobre o estágio e as técnicas da prática médica. A segunda parte versa sobre a peste propriamente dita, mostrando sua marcha sobre o continente europeu. Meu objetivo, portanto, é dar ao assunto