Preciso de cabulas xd

823 palavras 4 páginas
Ainda que insistentemente tranquilizada pelo confessor, tem D. Maria Ana, nestas ocasiões, grandes

escrúpulos de alma. Retirados el-rei e os camaristas,

deitadas já as damas que a servem e lhe protegem o

sono, sempre cuida a rainha que seria sua obrigação

levantar-se para as últimas orações, mas, tendo de

guardar o choco por conselho dos médicos, contenta-se

com murmurá-las infinitamente, passando cada vez

mais devagar as contas do rosário, até que adormece

no meio duma ave-maria cheia de graça, ao menos

com essa foi tudo tão fácil, bendito seja o fruto do

vosso ventre, e é no do seu ansiado próprio que está

pensando, ao menos um filho, Senhor, ao menos um

filho. Deste involuntário orgulho nunca fez confissão,

por ser distante e involuntário, tanto que se fosse

chamada a juízo juraria, com verdade, que sempre se

dirigira à Virgem e ao ventre que ela teve. São meandros do

inconsciente

real, como aqueles outros sonhos

que sempre D. Maria Ana tem, vá lá explicá-los, quando

el-rei vem ao seu quarto, que é ver-se atravessando o

Terreiro do Paço para o lado dos açougues, levantando a saia à frente e

patinhando numa lama aguada

e pegajosa que cheira ao que cheiram os homens

quando descarregam, enquanto o infante D. Francisco,

seu cunhado, cujo antigo quarto agora ocupa, alguma

assombração lhe ficando, dança em redor dela, empoleirado em andas,

como uma

cegonha negra. Também

deste sonho nunca deu contas ao confessor, e que

contas saberia ele dar-lhe por sua vez, sendo, como é,

caso omisso no manual da perfeita confissão. Fique

D. Maria Ana em paz, adormecida, invisível sob a montanha de penas, enquanto

os percevejos começam a

sair das fendas, dos refegos, e se deixam cair do alto

dossel, assim tornando mais rápida a viagem.

D. Maria Ana limita-se única e exclusivamente a dar ao rei, um descendente legítimo. D. Maria Ana é frustrada, infeliz e traída, tendo uma vida em

Relacionados

  • TeseM RioRubem
    99277 palavras | 398 páginas