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Marlene Novaes*
O que foi isto? O que aconteceu para que mais de 1 milhão e meio de pessoas em 19 capitais e mais de 100 cidades brasileiras saíssem às ruas protestando? Qual é a natureza e o sentido das manifestações que tomaram o país, configurando o maior movimento popular da história do Brasil? Para qual direção apontam? São perguntas que persistem duelando com nossas inteligências. Como fenômeno social complexo, os atuais movimentos sociais intrigam analistas que aspirem às interpretações definitivas, haja a vista que a velocidade vertiginosa dos acontecimentos impede inferências sobre as tendências futuras. De todo modo, é intrigante refletir sobre os constrangimentos e as perspectivas abertas pela dinâmica dos movimentos neste tempo de redes sociais ativas.
Em Brasília, quando manifestantes violentamente chutaram o prédio do Congresso Nacional, espectadores pareciam torcer para que o mesmo não resistisse aos golpes e caísse de podre. Se as coisas por lá não estão podres, ao menos fedem muito. O descontentamento com o cenário nacional levou às ruas sujeitos de diferentes percursos sociais. O Movimento Passe Livre São Paulo (MPL) chamou mesmo foi para ir até ali na esquina, em passeata pela revogação do aumento da tarifa de ônibus. Mas, a multidão que se foi constituindo nas avenidas vinha com mais fome que os pobres que tem fome na rua. Uma fome velha, sentida, batida, dobrada e redobrada por respeito aos direitos de cidadania plena, pela partilha nas decisões do Estado, por uma vida civil com saúde, trabalho, moradia e educação e, sobretudo, fome de doer entranhas pela moralização na administração política da coisa pública.
Como lembra Todorov (2010), as guerras civis são o resultado da intolerância dos dominadores. O povo descontente tomando as ruas aos borbotões, a ameaça de generalização dos quebra-quebras, a violência desferida contra os