Poiesis 16 ART PrimeiraPessoa
3044 palavras
13 páginas
Relatos em primeira pessoa: Confissões artísticasMarlen Batista de Martino*
86 - Revista Poiésis, n 16, p. 86-95, Dez. de 2010
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Abordaremos neste ensaio a emergência de relatos biográficos que expõem narrativas dolorosas e angustiadas presentes na obra de três artistas contemporâneas.
Por meio da montagem interpretativa as obras funcionarão como elementos delatores do que denominamos de confissões artísticas. Os conceitos vertiginosos do medo e da solidão falarão de um momento onde a ferida se torna a própria língua. confissão, biografia, dor, arte contemporânea.
Porque o grande olho do abismo sempre me vigiou...
Juliano Garcia Pessanha
Percebemos que os artistas das duas últimas décadas vêm reconhecendo cada vez mais a necessidade de expor a própria existência como obra de arte, na tentativa de apresentar o peso da intimidade e o drama de existir. Desde pelo menos o final do século 19, ocorre de modo acentuado um processo no qual a esfera privada vem sendo cada vez mais valorizada em detrimento da esfera pública. Desde a agitação cultural dos anos sessenta, o mundo vem assistindo a uma progressiva despolitização e dessindicalização. No século 20, assistimos à decaída dos sistemas e ideologias que no século anterior eram creditadas como soluções ideais para o problema da humanidade.
Vários foram os motivos pelos quais perdemos nossas crenças no homo politicus: as duas grandes guerras que levaram milhares de homens a morrerem “pela sua pátria” e pelo progresso do sistema capitalista e dos estados nacionais; o mundo “civilizado” que em um ato bárbaro na Segunda Guerra mundial levou ao extermínio e à deportação de milhares de judeus nos campos de concentração da Europa Ocidental e da Hungria; a Revolução Russa de 1917, e a posterior tomada de poder por Stalin, um dos maiores ditadores da história, e a
*Marlen Batista de Martino é Doutora em História, Teoria e Crítica de Arte pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul/ Alanus
Hochschule - Köln. Mestre em