Perfil de um usuário de crack
Cracolândia, bairro do Bom Retiro, São Paulo, Brasil.
Segunda-feira, 12 de Maio de 2014.
Ele tem a pele bronzeada, mas dá para perceber que ele é um senhor branco.
Os olhos são de uma cor opaca, um misto do verde de nascença com o branco azulado da catarata, presente dos vários anos já vividos.
Falando em anos, pergunto a ele sua idade e ouço que “deve ser uns 54 anos, não lembro mais ao certo” e isso me espanta. Não sei dizer com precisão o que de fato me espantou, não sei se foi o fato dele não saber a própria idade ou o fato de eu achar que ele tinha uns 20 anos a mais.
A minha confusão é justificada pela pele queimada e cheia de vincos, marcas que denotam uma vida sofrida e árdua. O físico frágil era perceptível pelos braços mirrados que saiam de dentro da camiseta do Chelsea – um time de futebol inglês -, braços que pareciam desprovidos de músculos, braços que pareciam apenas finos ossos vestidos com uma pele que ficava pendurada neles.
Não sei dizer se eles eram fortes ou não, mas com certeza seus braços tinham força suficiente para segurar a pequena garrafa de pinga que repousava firme entre seus dedos. Vez ou outra enquanto me contava sua história, pedia licença para “dar um gole” da sua garrafa e perguntava se estava atrapalhando ou me chateando com sua história.
Além da camisa, ele vestia uma calça rota, com rasgos e encardida. Usava um chapéu bege que já deveria ter sido branco em algum momento. Encravada na parte de trás do chapéu, uma pena verde balançava com o vento que soprava. Em seus pescoço várias medalhas, não de santos ou de alguma religião, mas medalhas que se ganha quando participa de uma competição.
Apesar da aparência maltrapilha, esses pequenos gestos como pedir licença e perguntar educadamente se estava me importunando ou não, fazia-me perceber que ele não era um qualquer – culturalmente falando -, um iletrado que encontrou nas ruas a única opção de vida.
Olhava constantemente para o lado,