Origens e estruturação histórica do léxico português
Joseph-Maria PIEL
1. O léxico de uma língua de civilização como a língua portuguesa é um organismo vivo, extremamente complexo na sua composição, pois resulta de um trabalho multissecular de elaboração e de selecção, cujos princípios se situam bastante para além da época em que o português se manifesta como instrumento literário nos primeiros documentos escritos (cerca de 1200). Como sucede com o léxico das demais línguas de cultura, nunca será possível reconstituir todas as fases por ele percorridas e destrinçar a contribuição das muitas gerações que nele colaboraram até se constituir o magno edifício que hoje se nos depara nos grandes dicionários modernos. Este longo e laborioso passado explica a falta de homogeneidade, em perspectiva histórica, que caracteriza a sua estrutura. Com efeito, o conjunto vocabular do português nunca se manteve estacionário, antes evoluiu constantemente num ritmo ora mais, ora menos acelerado, evolução que não chegou ainda ao seu termo e que representa o esforço comum de homens procedentes de ambientes geográficos e sociais muito diversos.
Entre as formas faladas-populares e as cultas-literárias observa-se uma permuta contínua e fertilizadora, em ambos os sentidos. Ao caudal vocabular do primitivo património afluiu, em ondas sucessivas, uma infinidade de elementos estrangeiros, europeus e extra-europeus, entrando em linha de conta praticamente todas as línguas com que os Portugueses, no decorrer da sua história, estiveram, directa ou indirectamente, em contacto.
2. Concebida em moldes modernos, a disciplina que se ocupa da origem das palavras, ou seja a etimologia, já não se contenta com identificar a forma actual de um vocábulo com a sua forma primitiva subjacente, mas esforça-se por reconstituir a sua história externa (fonética) e interna (semântica) através