Noturno à janela do apartamento
(1) Silencioso cubo de treva:
(2) um salto e seria a morte.
(3) Mas é apenas, sob o vento,
(4) a integração na noite.
(5) Nenhum pensamento de infância,
(6) nem saudade nem vão propósito.
(7) Somente a contemplação
(8) de um mundo enorme e parado.
(9) A soma da vida é nula.
(10) Mas a vida tem tal poder:
(11) na escuridão absoluta,
(12) como líquido circula.
(13) Suicídio, riqueza, ciência...
(14) A alma severa se interroga
(15) e logo se cala. E não sabe
(16) se é noite, mar ou distância.
(17) Triste farol da Ilha Rasa.
Esta análise do poema “Noturno à janela do apartamento” de Carlos Drummond de Andrade busca observar como os elementos utilizados em sua construção – as unidades de ritmo, sonoridade e significado – se articulam e como elas contribuem para a intensificação das camadas de significação do poema. Mostrar o que diz poesia é mostrar como diz (MERQUIOR, 2012:29). O conhecimento dos elementos da linguagem (matéria da construção da poesia) e das suas relações na composição do poema, permitem o entendimento do poema e dão suporte a uma interpretação adequada. O levantamento de padrões, de rupturas, de padrões rítmicos, das associações semânticas que buscam correlações e potencializam os significados, do destaque de palavras ou trechos através de sua sonoridade e o levantamento de informações externas ao poema que possam contribuir para a análise, traz uma visão das partes que o compõem e que devem ser reintegradas em suas relações para a compreensão do todo, do significado geral que o poema traz. “Noturno à janela do apartamento” foi publicado no livro Sentimento do Mundo de 1940. Nesta obra há uma mudança na forma com que o sujeito se posiciona frente ao mundo. O eu orgulhoso, altivo e individualista que aparece nos dois primeiros livros de Drummond – Alguma poesia (1930) e Brejo das Almas (1934) – cede lugar a um eu enfraquecido e as questões pessoais do sujeito passam a ter menor