Nossa Rainha - Marcelino Freire
Mãe, eu quero ser Xuxa. Mas minha filha. Eu quero ser Xuxa. A menina não tem nem nove anos, fica tagarelando com as bonecas. Com as pedras do Morro. Eu quero ser Xuxa. Mas minha filha. A mãe ia fazer um book, como? Viu no jornal quanto custa. Perguntou ao patrão no Leblon. Um absurdo! Ia bater na porta da Rede Globo? Nunca. A menina parecia uma lombriga. Porque nasceu desmilinguida. Mas vivia dizendo, a quem fosse: eu quero ser Xuxa. Que coisa! Que doença! Ainda era muito pequena. Eu quero ser Xuxa. Quem não pode se acode. A mãe já vivia da ajuda do povo. Mas tinha de levar a menina ao cinema. Toda vez que aparecia um filme novo. O que Xuxa está pensado? O que Padre Marcelo está pensando: Que tanto disco à venda, que tanto boneco, que tanta prece! Tenha santa paciência. O padre Marcelo a mãe trocou por um pai-de-santo. Esse, pelo menos, só me pede umas velas.
De quando em quando, uma galinha preta. Que eu aproveito e levo daqui, quando tem réveillon. Despacho de rico só tem o que é bom. Mas a menina não tem jeito. É uma paixão que não tem descanso. Eu quero ser Xuxa. Eu quero ser Xuxa. Eu quero ser Xuxa. Um dia eu esfolo essa condenada. Deus me perdoe, Essa danada da Xuxa. Dou uma surra neça para ela tomar jeito. Fazer isso com filha de pobre. Que horror! A mãe mal chegou do trabalho a menina já falou. Que a Xuxa vem esse final de semana. O que ela vem fazer no morro?, a mãe perguntou. Se a Xuxa que eu conheço aqui é só você, querida. Alisou a cabeça da maldita, deu um abraço cego e mandou partir. Maldita, sim. Quem disse que a danada foi para cama? Puta que pariu! A mãe tinha de faltar ao trabalho de novo. Tinha medo que a filha tivesse um troço. Se jogasse debaixo do carro, sei lá. Fosse pisoteada, que remorso! Eu não. Mãe que é mãe acompanha a filha no dia mais feliz da sua vida. Pendurou a menina nas costas e enfrentou o calor. E o empurra-empurrão. E tambem