Neoclassicismo
Estes braços, Amor, com quanta glória
Foram trono feliz na formosura!
Mas este coração com que ternura
Hoje chora infeliz esta memória!
Quanto vês, é troféu de uma vitória,
Que o destino em seu templo dependura:
De uma dor esta estampa é só figura,
Na fé oculta, no pesar notória.
Saiba o mundo de teu funesto enredo;
Por que desde hoje um coração amante
De adorar teus altares tenha medo:
Mas que empreendo, se ao passo, que constante
Vou a romper a fé do meu segredo,
Não há, quem acredite um delirante!
Temei, Penhas...
Destes penhascos fez a natureza
O berço em que nasci: oh! quem cuidara
Que entre penhas tão duras se criara
Uma alma terna, um peito sem dureza!
Amor, que vence os tigres, por empresa
Tomou logo render-me; ele declara
Contra meu coração guerra tão rara
Que não me foi bastante a fortaleza.
Por mais que eu mesmo conhecesse o dano
A que dava ocasião minha brandura,
Nunca pude fugir ao cego engano;
Vós que ostentais a condição mais dura,
Temei, penhas, temei: que Amor tirano
Onde há mais resistência mais se apura.
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Tomás Antônio Gonzaga
Lira IV
Já, já me vai, Marília, branquejando loiro cabelo, que circula a testa; este mesmo, que alveja, vai caindo, e pouco já me resta.
As faces vão perdendo as vivas cores, e vão-se sobre os ossos enrugando, vai fugindo a viveza dos meus olhos; tudo se vai mudando.
Se quero levantar-me, as costas vergam; as forças dos meus membros já se gastam; vou a dar pela casa uns curtos passos, pesam-me os pés e arrastam.
Se algum dia me vires desta sorte, vê que assim me não pôs a mão dos anos: os trabalhos, Marília, os sentimentos fazem os mesmos danos.
Mal te vir, me dará em poucos dias a minha mocidade o doce gosto; verás brunir-se a pele, o corpo encher-se, voltar a cor ao rosto.
No calmoso Verão as plantas secam; na Primavera, que aos mortais encanta,