natureza e sociedade
Em um artigo anterior, sobre seleção e transmissão cultural, afirmei que genético e hereditário não são sinônimos. Gostaria de me estender um pouco mais sobre esse tema.
Em vários ramos da ciência, principalmente nas ciências biológicas, não é nada incomum vermos os termos hereditário e genético tratados como sinônimos, utilizados nas mesmas situações e de forma perfeitamente intercambiável. Tecnicamente falando, contudo, essa liberdade não existe, e seu uso pode acarretar uma série de mal-entendidos, alguns definitivamente sérios. Na maioria dos casos, o hereditário (do latim heres, herdeiro) é também genético (a partir do grego γεννα, “família”), mas há situações em que o objeto, caráter ou fenômeno pode ser genético sem ser hereditário, e outras em que pode ser hereditário sem ser genético.
A origem causal (etiológica) dos caracteres ou propriedades das entidades biológicas é geralmente definida ou como hereditária/genética ou como dependente de fatores do meio em que o organismo está inserido. Antes mesmo de nos aprofundarmos na discussão sobre as diferenças entre hereditário e genético, vale à pena ressaltar a falácia metodológica contida neste raciocínio. Trata-se da “exclusão do meio termo, ou falsa dicotomia: considerando apenas um dos extremos num continuum de possibilidades intermediárias”. A primeira vez que li sobre isso foi no excelente “o mundo assombrado pelos demônios”, de Carl Sagan, muito antes de estudar as falácias lógicas e suas categorias. É extremamente comum, por exemplo, ouvirmos a pergunta “a inteligência é, afinal, de origem genética ou determinada pelo meio?”, como se de fato as duas causas fossem mutuamente excludentes. Logo, pode-se perfeitamente atribuir a determinado fenômeno ou caráter uma mistura de causas, com eventual predomínio de uma delas.
Contudo, se nos deparamos com um traço fortemente ligado a uma família, estatisticamente relacionado a uma linhagem de várias gerações,