Musica
Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,
Ondula como um canto de ave
No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.
Ouvi-la alegra e entristece,
Na sua voz há o campo e a lida,
E canta como se tivesse
Mais razões pra cantar que a vida.
Ah, canta, canta sem razão!
O que em mim sente 'stá pensando.
Derrama no meu coração
A tua incerta voz ondeando!
Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência
Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!
Tema
Inconsciência (sentir e pensar).
“Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso.”
Assunto:
O sujeito poético pega no exemplo da ceifeira para explicar a sua vontade de viver, sem pensar mas tendo consciência disso ou seja, isso é impossível.
Divisão em partes lógicas/ Paráfrase:
O poema está dividido em duas partes.
A primeira parte é constituída pelas três primeiras estrofes, no qual o sujeito poético descreve a ceifeira e a sua voz.
A segunda parte é constituída pelas últimas três estrofes do poema, no qual o poeta expressa os sentimentos e as emoções que aquele canto desperta nele, esta estrofe está dividida em dois momentos: - O poeta lança um apelo à ceifeira para que continue a cantar a sua canção inconsciente, porque esta emoção o obriga a pensar e a desejar ser ela, sem deixar de ser ele (aspiração ao impossível, porque ter a consciência da inconsciência é deixar de ser inconsciente);
- Ciente dessa impossibilidade, o poeta lança uma apóstrofe ao céu, ao campo, à canção, personificados, pedindo-lhes que entrem dentro dele, o transformem na sombra deles e o levem para sempre.
Figuras de