Multiculturalismo
Estado-Nação e
Multiculturalismo
Manifesto, 1: 63-73.
Miguel Vale de Almeida
MIGUELVALEDEALMEIDA.NET
2002
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Estado-Nação e Multiculturalismo
Miguel Vale de Almeida
O século XIX europeu – prolongando-se pelo XX – foi o século do surgimento do EstadoNação tal como o conhecemos hoje. É recente a ideia de que a forma ideal de organização política, social e cultural seja a da correspondência entre um território, o exercício da soberania por um estado, uma língua nacional, e um povo. Sabemos hoje como a criação do Estado-Nação foi feita na base de violências reais e simbólicas, de exclusão do Outro e de invenção do Mesmo.
Sabemos também que esse processo foi contemporâneo, para algumas nações europeias, da construção dos grandes impérios coloniais. O empreendimento colonialista e o nacionalismo dos séculos XIX-XX partilhavam características e participavam da mesma lógica: se cada Estado se definia como o apuramento político de uma suposta civilização étnica e linguisticamente definida, as suas colónias seriam o lugar de confirmação de uma suposta vocação civilizadora, correspondente ao “espírito” ou “génio” supostamente contido no carácter nacional do colonizador. Mas a colónia foi também o lugar da invenção, verificação e aplicação dos conceitos que permitiam legitimar o estado-nação e colocá-lo no topo de uma linha de evolução histórica.
Se, por um lado, o Estado-Nação permitia conceber uma ideia de “comunidade” que elidia as diferenças e desigualdades internas (de género, de classe, de região, etc.), a
Colónia, por outro, assegurava a ordem “natural” de uma desigualdade hierárquica, implícita na ideia de que alguns povos ou nações seriam superiores e teriam a obrigação de tutelar os outros, inferiores. Nacionalismo e colonialismo alimentaram-se mutuamente e foi assim que se construíram as comunidades – agora instáveis e contestadas – em que vivemos pelo século XX fora. E que agora se encontram em plena crise.
Nos