missa do galo
— Ainda não foi? Perguntei.
— Não fui, parece que ainda não é meia-noite.
— Que paciência! Entrei na sala, arrastando as chinelinhas da alcova. Vestia um roupão branco, mal apanhado na cintura. Ele fechou o livro, eu fui me sentar na cadeira que ficava defronte de Nogueira, perto do canapé. Ela me perguntou se a havia me acordado, sem querer, fazendo barulho, respondi com presteza:
— Não! Qual! Acordei por acordar.
Ele me encarou um pouco.
— Mas a hora já há de estar próxima, ele disse.
— Que paciência a sua de esperar acordado, enquanto o vizinho dorme! E esperar sozinho! Não tem medo de almas do outro mundo? Eu cuidei que se assustasse quando me viu.
— Quando ouvi os passos estranhei: mas a senhora apareceu logo.
— Que é que estava lendo? Não diga, já sei, é o romance dos Mosqueteiros.
— Justamente: é muito bonito.
— Gosta de romances?
— Gosto.
— Já leu a Moreninha?
— Do Dr. Macedo? Tenho lá em Mangaratiba.
— Eu gosto muito de romances, mas leio pouco, por falta de tempo. Que romances é que você tem lido?
Ele começou a me dizer os nomes de alguns. Eu o ouvia com a cabeça reclinada no espaldar, enfiando os olhos por entre as pálpebras meio-cerradas, sem os tirar dele. De vez em quando passava a língua pelos beiços, para umedecê-los. Quando acabou de falar, não disse nada; ficamos assim alguns segundos. Em seguida,endireitei a cabeça, cruzei os dedos e sobre eles pousar o queixo, tendo os cotovelos nos braços da cadeira, tudo sem desviar de os olhos dele.
Ele falou:
— D. Conceição, creio que vão sendo horas, e eu...
— Não, não, ainda é cedo. Vi agora mesmo o relógio, são onze e meia. Tem tempo. Você, perdendo a noite, é capaz de não dormir de dia?
— Já tenho feito isso.
— Eu, não, perdendo uma noite, no outro dia estou que não posso, e, meia hora que seja, hei de passar pelo sono. Mas também estou